Repertorium

"Blogue de notas" da unidade curricular de Análise de Fonogramas e Eventos da Licenciatura em Música variante Produção e Tecnologias da Música, da Escola Superior de Música e das Artes do Espectáculo, do Instituto Politécnico do Porto. Um Moleskine virtual cujo tema é "O mundo da música e as músicas do mundo". Orientação do Professor Mário Azevedo

terça-feira, outubro 14

Carta a Giovan Battista Doni

No início do Século XVII, nascem, em Itália, três das principais formas de modernas: A melodia vocal, a ópera (na sala da congregação do Oratório de Roma, em 1600, apareceu a primeira ópera.) e a oratória. Na sala da congregação do Oratório de Roma, em 1600, apareceu a primeira ópera.

Em finais do século XVI reuniram-se em Florença, no palácio do Conde de Bardi, amigo e admirador da arte clássica, os mais célebres artistas daquele tempo, constituindo uma espécie de academia: a “camerata fiorentina”, na qual se discutia, musica e poesia segundo as doutrinas dos filósofos gregos.

Vicenzo Galilei – pai do famoso astrónomo – que pertencia a esse cenáculo, compôs três solos vocais com acompanhamento de alaúde sobre texto do “Inferno”, de Dante e das Lamentações de Jeremias, imitação dos hinos gregos; a influência clássica levou o poeta Rinuccini e o músico Jacopo Peri com a “Euridice”, representada pela primeira vez em Florença em 1600, à criação da ópera quando apenas se pensava fazer ressurgir o drama antigo.

Na “Euridice” de Peri encontra-se o emprego do baixo cifrado aludindo o autor no prefácio a Emílio del Cavaliere aparentemente como inventor desse modo de indicar acordes e um dos primeiros a escrever em Stilo Rappresentativo.

A carta que se segue (um resumo) fala destes tempos:

«O meu pai, Signor Giovanni, que tirou grande satisfação da música e foi um compositor com alguma reputação no seu tempo, sempre teve com ele os mais ilustres homens da cidade e, convidando-os para a sua casa, formou uma espécie de academia. Passavam lá o seu tempo, não apenas em busca de novas formas musicais, mas também em discussões, aprendendo poesia, astrologia e outras ciências.

Vincenzo Galilei, pai do famoso astrónomo, homem de grande reputação naqueles dias, fez estudos de música na academia. Ele procurou, com a ajuda daqueles virtuosos, extrair a essência do grego, do latim e dos mais modernos escritores, e, desta forma, tornou-se um meticuloso mestre da teoria musical.

Um dos principais objectivos da academia foi restabelecer a música antiga, melhorando-a e aumentando-a, em certa medida, a partir do estado deplorável a que tinha sido reduzida.

Assim, ele foi o primeiro a deixar-nos ouvir cantar em stile rappresentativo, então considerado quase irrisório. Apoiado pelo meu pai, ele foi o principal incentivador deste estilo. Trabalhou durante várias noites e com grandes despesas pela causa desta nobre descoberta. Vincenzo aprendeu, com o livro do meu pai, música antiga e moderna. Assim ele deixa-nos ouvir as lamentações do Conde Ugolino, de Dante, cantadas por um bom tenor e acompanhado por violas da gamba. Com esta novidade, ele despertou inveja entre os músicos profissionais, mas foi gratificante para os verdadeiros amantes da arte. Continuando com esta demanda, Galilei definiu uma parte das Lamentações e Respostas para a Semana Santa, sendo estas cantadas por devotos.

Giulio Caccini, considerado um cantor singular e um homem de bom gosto, embora muito jovem, estava com o meu pai e sentiu-se inclinado para essa nova música. Sob instruções do meu pai, ele começou a cantar arietas, sonetos, poemas e outros temas apropriados para leitura em voz alta, de uma forma que espantou os seus ouvintes.

Também em Florença, naquele momento, estava Jacopo Peri, o primeiro aluno de Cristofano Malvezzi, que recebeu elogios por ser um grande executante de instrumentos de teclado e como compositor de contraponto. Este homem, em concorrência com Giulio, trouxe o stile rappresentativo à luz, evitando uma certa aspereza e excessiva antiguidade que tinha sido sentida nas composições de Galilei. O primeiro poema a ser cantado no palco em stile rappresentativo foi “A história de Dafne”, por Ottavio Rinuccini, musicado por Peri. Com cenas curtas, foi recitado e cantado em privado numa pequena sala. Fiquei sem fala com o espanto. Após Dafne, outras histórias foram representados pelo próprio Signor Ottavio que, por ser bom poeta e bom músico, foram recebidas com grandes aplausos. As mais famosas dessas histórias foram Euridice e Arianna. Não houve falta de homens a imita-lo, em Florença e em outras cidades da Itália, especialmente em Roma. Entre os primeiros destes parece adequado colocar Monteverdi».

Giovanni Battista Doni (1594 – 1647) foi quem substituiu a sílaba ut pelo dó, que é mais cómodo para a solmização.

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